sábado, 31 de maio de 2008

Iberê Camargo: existe uma parada...próxima

Se tem uma coisa que eu gosto de fazer aos sábados pela manhã é ler o caderno Cultura, da Zero Hora. O nome e a diagramação parecem afastar leitores "comuns". Quando abrimos um suplemento que fala sobre artes, literatura, música, jornalismo e tudo com textos maiores que aqueles que estamos acostumados, pensamos logo em desistir, deixar para uma outra hora. Afinal, caderno de cultura é coisa para intelectuais!Mero preconceito.
As matérias são escritas em um português muito mais claro que o imaginado. O público-alvo deve até ser uma camada mais restrita da sociedade, mas nada nos impede de tentar. Alguma vez tive esta brilhante idéia e gostei. Longe de ser uma amante incondicional de livros, uma profunda entendedora de literatura, eu, uma estudante comum em nível universitário, "perco" um tempinho com isto. Confesso que não leio todo o jornal, mas tenho uma ótima explicação para isso: um dos meus trabalhos, durante a semana, é taxação de jornal. Folheio as páginas de quatro diários de Porto Alegre, o que me fez pegar "certo" asco às folhas cinzentas. Minhas mãos ficam imundas. É nojento. Porém, não estou congelando meus dedos nesta friaca gaúcha para falar exatamente sobre jornal. E sim sobre o conteúdo que hoje absorvi do mesmo.
O tema central do caderno é a Fundação Iberê Camargo. Nas páginas que seguem há explicações sobre a arquitetura do prédio - motivo de orgulho para a cidade, já que, ao que tudo indica, a capital acaba de entrar no circuito internacional com a enigmática obra de Álvaro Siza. em seguida, podemos conhecer melhor a obra do artista, além de saborear uma entrevista com a viúva, Maria Camargo.
Não entendo muito sobre o assunto, mas, trabalhando há mais de um ano em um escritório de arquitetura e tendo uma mãe interessada no assunto, posso dizer que não sou de um todo leiga. Admiro esta arte - para mim, arquitetura é arte - do início ao fim. Pela fotos que já vi, a construção é mesmo impressionante. Sem contarmos toda a questão sustentável do projeto. As soluções são interessantes e, ao mesmo tempo, simples.
Devo dizer também que, antes de todo alvoroço provocado pela inauguração do museu, eu não sabia muito sobre a obra de Iberê. Ter uma mãe que foi professora de artes por mais de 25 anos ajuda e muito. Nomes de artistas, escolas e influências foram sempre muito presentes na minha vida. Na época da fita de vídeo, muitas vezes acompanhei minha mãe escolhendo aquela que seria passada para a turma, em sala de aula. Eram vídeos sobre Van Gogh, Picasso, cores quentes e frias, expressionismo e tudo mais. O nome de Iberê parecia-me bastante familiar, ao contrário de sua obra. Através da reportagem de Zero Hora, hoje posso dizer estar muito mais "por dentro" do assunto.
E, justamente esta matéria, me despertou a vontade de conhecer o local. Não costumo ir a museus. Aliás, isto é um fato interessante. Quando viajamos vamos a museus como loucos. Podemos estar em Cacinbinhas que achamos o Museu do Salame que seja para conhecermos. Em Paris, fui até mesmo no Museu de História Natural. Tá, macacos e ossadas de dinossauros até que não são tão chatos, mas não me atraem nem um pouco. Retornando à Porto Alegre, continuamos na vida de sempre.
Já fui no Margs, conheço o Santander e o Centro Cultural CEEE. Entretanto, posso contar nos dedos quantas vezes passei por estes lugares. Trabalho na Secretaria de Cultura e a todo momento exposições novas estão à disposição do público, gratuitamente, na Usina do Gasômetro. Me pergunte a quantas delas assisti?Provavelmente, nenhuma. É uma vergonha, somos uma vergonha.
Claro que ao museu da Padre Cacique irei. Parece impensável não ir. Bom, vendo pelo lado positivo, é melhor que nada. Mas foi justamente quando pensei na minha programação cultural que me deparei com uma grande questão: o transporte público. Parece piada, mas infelizmente é a realidade. A cidade recebe uma obra desta magnitude, com investimentos de 40 milhões. A mídia investe na divulgação. Todos estão contentes, orgulhosos e certos de que agora finalmente Porto Alegre caminha para a tão sonhada capital da cultura. A esperança de que a população se empolgue com a novidade e comece a se interessar e mesmo se acostumar com arte é totalmente cabível. A entrada gratuita do museu é um incentivo. Encontramos apenas um único e "insignificante" probleminha: não existe transporte público até o local. No jornal há um box onde é possível saber quais linhas de ônibus nos levam até Iberê Camargo, perfeito, até lermos um detalhe. "Existe uma parada próxima ao museu, na volta a pessoa deve se dirigir até blábláblá". O que seria próxima?Para uma pessoa de 60 anos próxima pode significar a 30cm, para um maratonista, a 30km. Na volta, temos de caminhar até o Big Cristal.
Vocês podem pensar que o público do museu tem carro. A venda de veículos no Brasil aumenta a cada mês, não à toa caminhamos, se já não estamos, para o caos dos engarrafamentos diários. Tudo isso é verdade. Mas também é bem verdade que muitas pessoas dependem do transporte público. Eu mesma sou um belo exemplo, minha família não possui carro. Não, não somos de outro mundo. E garanto que pegar ônibus todo o dia não dói. Tá, um pouco, T9 às 18h não é legal, mas enfim. O que me indignou foi a falta de preocupação com esta simples e importantíssima questão. Querem que o povo adquira hábitos culturais. Como? Se nem mesmo o acesso até esses temos.

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